

Eu sou Cristina Dias, sou professora de Criação e redação publicitária e processo criativos aqui na Belas Artes e na ECA.
Qual a relação que a Comunicação e a Publicidade têm com a moda atualmente?
Na verdade, elas têm uma ligação intrínseca, porque o consumo de moda, em fato, é uma maneira de você publicitar um estilo, já que a moda faz com que seu corpo seja uma plataforma de manifestação, não é simplesmente uma moda para você se sentir bem ou bonita: é uma maneira de mostrar sua identidade. A Publicidade trabalha muito com estilo de vida e a moda é um dos "lugares" onde esse estilo de vida melhor se manifesta. É o que eu sempre falo: A Nike hoje não vende tênis, ela vende um estilo de vida.





Sobre o Canevacci, ele fala bastante sobre o Jeans, que é bastante usado no estilo Old Style. Como é que podemos aplicar as teorias dele em relação a volta do Old?
As teorias dele especificamente, eu não conheço. Na verdade, nós trabalhamos com um eterno retorno. A gente ressignifica tudo, tudo vai e volta. Não é de hoje que isso ocorre, sempre ocorreu. Vamos ao encontro do que passou, é uma maneira de reencontrar uma identidade perdida e fazer uma releitura do que passou. A moda ressignifica, assim como a publicidade e a música; sempre a um passo a diante, nada nunca é igual. É sempre diferente, apesar de ser da mesma referência cultural.
E sobre a mídia secundária em relação à vestimenta e expressão corporal?
Foi como já mencionei lá no começo, olhando ideologicamente, tem muitas marcas que sabem disso. A gente tem um texto sobre as grandes narrativas de identidade, que essas grandes narrativas foram desmoronando. Antigamente tinha grandes representantes: escola, família, religião. Hoje, essas grandes narrativas, como disseram alguns autores (Centrine, Fontenelle, Stuart Hall, Bauman), que essas grandes narrativas desmoronaram no contemporâneo – muitos chamam de pós modernidade, eu não nomeio dessa maneira porque eu acho que a gente ainda está em uma alta modernidade.
O Lipovetsky fala de hipermodernidade. Na verdade, quando as grandes narrativas se desestruturam, as marcas ocupam o espaço que antes não era delas e as pessoas acabam amando as identidades aos estilos de vestir. Por exemplo, que refletem os estilos de vida e isso altera constantemente. Por isso que a moda precisa se alterar constantemente também, as identidades são muito fluidas hoje: uma hora estão assim, outra hora estão assado e junto disso, a moda ajuda a compor essa identidade. O corpo é uma plataforma de manifestação. E a moda, é a maneira mais visível de a gente manifestar a nossa identidade.
Você acredita em um interesse econômico com essa criação de brechós e volta de algo retrô, além do interesse publicitário e de estilo de vida?
Com certeza! Sempre tem. A gente vive em uma sociedade capitalista. Por mais que a gente não queira ter esse olhar ideológico, a nossa sociedade tem por visão, o lucro. Sempre o lucro. E a Publicidade, por mais que entretenha, por mais que ela seja fã, o objetivo de qualquer peça publicitaria é vender. Mesmo que ela seduza, te faça chorar, ela quer que você lembre daquela marca na hora que você for consumir determinado produto. E os brechós fazem parte dessa lógica da ressignificação.
Também tem o lance do descarte. O Mackey, que é o cara que estuda a cultura do consumo, ele fala que existe rituais de compras, rituais de posse, rituais de uso e rituais de descarte. O brechó, talvez a gente considere ele, dentro dos rituais de descarte, porque na verdade, você não descarta, você ressignifica. A geração de vocês, é uma geração que não tem tanta necessidade, talvez, de possuir, de comprar e de usar. E por isso, tem esse ritual de descarte. Na Alemanha, muitas lojas não têm marca, elas trabalham com troca: você vai, leva um produto e pega outro. Vocês trabalham muito com aplicativo de Uber, por exemplo, você não precisa ter o carro. É um ritual de uso, não um ritual de posse. Estamos indo para um capitalismo que tem mais esses rituais de uso, do que ritual de compra e de posse. Mas, para a gente usar alguém compra sempre. Então brechó é um dos pontos do capitalismo. Conheço alguns brechós que trabalham com a moda de gente muito rica, que compra a roupa para usar apenas uma vez. O quê que você vai fazer com essa roupa?
Um deles era o "Brechó chique", não sei se ele ainda existe, mas uma socialite comprava um vestido da Channel e usava uma vez e esse brechó revendia essas roupas. É uma maneira de quem não pode acessar esses bens, se sentir mais perto. Mas, isso é uma lógica que vem desde o começo da moda, quando a plebe não podia usar a roupa que o rei e a rainha usavam. Eles viam e achavam um máximo e tentavam copiar o estilo, e quando conseguiam copiar o rei e a rainha, o estilo deles já mudava porque eles precisam ter uma marca de identificação e essa vinha através das marcas das roupas. E assim, a moda vai se reinventando. Os produtos que a elite usa, muitas pessoas não têm acesso. E aí já entra a pirataria, que é uma forma de burlar. Enfim, o brechó faz com que algumas peças possam chegar mais perto de pessoas que não teriam acesso a elas.
Então atualmente seria mais forte a influência sobre a roupa das pessoas, desde da onde elas querem chegar, o que elas querem ser, do que uma expressão própria?
Não! As duas coisas caminham juntas. Na década de 80 tinha uma campanha da Us Toffee, que é uma marca de Jeans e era uma campanha de camisas. O slogan era: "O mundo trata melhor quem se veste bem." e bombou.
Por isso é tão importante a publicidade, ela não cria nada de novo, ela busca tudo que tá no cotidiano e traz para a superfície, joga luz. Por exemplo, a Rua Augusta produz muitos estilos por causa dos bares e da diversidade que existe nela. É algo que reflete e refrata, é um jogo. A Publicidade se alimenta do cotidiano.
Tu crê que a gente caminha pra uma formação e produção de roupa sem sexo definido?
Eu espero que sim! Eu acho que questão de gênero é uma questão cultural, não existe diferença de gênero. A gente é educado dessa maneira e a gente naturaliza a questão de gênero, acho que não existe distinção. Espero que todos possam o que quiser, independentemente de gênero.



